Viola no Café da Virada II

Em outros tempos, até mais ou menos uns dois anos atrás, talvez eu não me importasse tanto, ou talvez eu não batesse tanto o pé assim, por conta de um café da manhã (e às cinco da matina), só porque ele seria regional demais e, por isso mesmo, bão demais. Eu nasci em São Paulo, na capital, como minha mãe, meu pai, minhas avós. Em tempos de menina eu ia pro mato só vez ou outra, naquele sítio do amigo do meu pai, ou do amigo do amigo. Por minha mãe moraríamos na Av. Paulista, esquina com a Consolação, ou com qualquer outra esquina concreta, boêmia. Além da boemia, meu pai prefere a praia e eu, escritora que sempre quis ser, sempre amarguei uma saudade de morar num campo que nunca vi, só ouvi falar, por conta de Chico Bento ou outro personagem caipira qualquer. Acho que esta minha saudade das campinas que nunca vi se deve ao fato de eu querer andar mais devagar, ver o tempo parar, olhar para o céu, contar as estrelas. Mas eu, que nasci na cidade grande, não tenho hábito de olhar para o céu, deixando este momento para as raras vezes que alguém me diz: você viu a lua hoje? Tão bonita!, que é quando eu me dou conta de que eu, escritora que sempre quis ser, sempre amarguei uma saudade de morar num campo que nunca vi, tomar aquele café da manhã que nunca tomei.
Toda vez que eu me dou conta de que não sou escritora, bate uma saudade danada destas coisas que não vivi. Então eu pirei quando eu fiquei sabendo que durante a Virada Cultural ia ter um tal de café da manhã moído no pilão, e que teria viola, sanfona e percussão. Bati o pé mesmo, fiz manha, birra, barganha, tudo que tinha direito e não me arrependi. Broas, bolos, pães, sucos, café com leite (que não estavam no bule, hunf!). Tudo bem, lá em Itanhanhém, na praça toda bonita e caprichada, tem a Casa da Avó (ou algo que o valha, não lembro o nome), e lá tem café com leite servido no bule. Dia desses eu tomei o café da casa mesmo, que é feito com leite condensado, docinho e muito bom. Daí me servi de um bolo de cenoura, coberto com chocolate e, depois, um de côco. Mais ou menos como eu fiz na virada, quando resolvi viver um pouco mais desta minha vida que nunca vivi, a não ser de passagem.
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