Flagrantes da vida real.

Naqueles tempos do século passado, anos cincoenta, sessenta, as fontes de informação eram poucas e raras lá pelas bandas do interior. Rede social para as crianças eram as ruas e os quintais e, ruas no bom sentido, o das brincadeiras de rua com as mães despreocupadas de possíveis "más influências" daquelas ruas. Redes sociais dos adultos eram as conversas entre vizinhos no fim de tarde e início da noite, os filhos ouvindo em silêncio, de longe, participando ali da transmissão oral do conhecimento.
Notícias do que acontecia no Brasil e no mundo chegavam pelos poucos aparelhos de rádio e os que possuíam os aparelhos repassavam as notícias naquelas conversas. Livros nas bibliotecas, públicas ou das escolas, eram poucos, situação não muito diferente dos dias de hoje. Lares com melhor condições possuíam a Enciclopédia Barsa, privilegiada fonte de consulta, mesmo que em muitas casas ser utilizada como decoração de estantes e uma certa demonstração de poder e falso conhecimento. Afinal eram vários volumes, grandes e pesados e impunha respeito.
Uma publicação, até pelo baixo custo, eram a Seleções do Reader’s Digest, adquirida através de assinatura e enviada ao representante local que fazia a distribuição aos assinantes. Fazia parte da propaganda dos Estados Unidos de mostrar que o american way of life, seu sucesso, a sua democracia e seu capitalismo eram superiores ao socialismo da então União Soviética. Seu conteúdo mostrava a força americana em invenções, descobertas e superações do homem americano e sua influência no mundo “livre”. Algumas seções eram fixas: Piadas de caserna, Flagrantes da vida real, Rir é o melhor remédio, entre outras, com muitos “causos” enviados pelos leitores.
Em um desses relatos, em Flagrantes da vida real, alguns estudantes viajando de ônibus fizeram uma brincadeira com os outros passageiros. Esconderam na mochila, junto aos livros, um despertador que em certo momento da viagem tocou e um dos estudantes tirou da sua bolsa um aparelho de telefone, daqueles usados apenas nas casas, e atendeu “conversando” com um familiar do outro lado. O motorista teve que parar o ônibus em conseqüência do susto dos demais passageiros, que consideraram aquela conversa como do outro mundo e ficaram completamente assustados.
Para os mais jovens: despertador era um relógio pesado, alguns medindo até 15 centimetros de diametro, com duas campainhas e que ficava ao lado da cama sobre o criado mudo. Telefone era um aparelho muito usado para fins de comunicação e que foi inventado por Alexander Graham Bel lá pelo final do século dezenove. Criado mudo era um pequeno móvel com gavetas e com a sua "tampa" usada para colocação de bíblias, abajur, água para beber à noite e etc.
Ninguém ali poderia imaginar a possibilidade daquele tipo de conversa via telefone sem fio. Ou, é possível, que alguns daqueles estudantes tenham participado anos depois da invenção do que nós conhecemos por telefone celular. Hoje o telefone móvel presente em todas as classes sociais é usado, em alguns momentos, para conversa entre duas pessoas, alguns adultos principalmente. Boa parte da galera desconhece essa função do aparelho e usam para envio de mensagens, ouvir musica, acessar redes sociais, jogos e como relógio.
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