E a cada esquina, artesanato pop e tradicional se alternam; perdoem o lugar comum, mas ao fim e ao cabo, perdura a satisfação de se saber que todos saem satisfeitos de um passeio domingueiro pela Paulista... Enfim, nada como uma dessas longas tardes descontraídas para, de mente e coração abertos, se abrir à descobertas que ao fim hão de revelar-se desconcertantes!
As artesãs Angelina e Riva Waldvogel
No palco do Teatro Popular do SESI, o brasileiro de origem libanêsa Sami Bordokan mostrava sua arte – que em se tratando de quem seja, talvez o termo “arte” não seja o mais adequado. Diria suas “experiências” ou “vivências”, dentre as quais, a arte é um dos ingredientes . Aquilo que grosseiramente enfaixamos sob o rótulo de “musica oriental”, a partir do médio até o extremo Oriente se inserem em contextos que nós ocidentais temos grande dificuldade em compreender, sobretudo se as apreciarmos como produto de entretenimento (ou mais diretamente, como consumo); sejam as peças litúrgico-religiosas, cantos de trabalho ou folguedos (aqui remetendo diretamente às danzas que da Ibéria sob dominação moura que se espalharam pelo mundo, notoriamente na pampa sulamericana, Andes, América Central).
Curiosamente, a música de pura origem popular – benditos, Folias, aboios, etc., igualmente tem igual significado: seus praticantes os executam com fervor e/ou êxtase religioso. Antes de tudo, são obrigações de ofício - vide a obra de Eliezer Teixeira, tio da nossa Musa Kátya Teixeira e, porque não?, a própria obra de Kátya e seus incisivos mergulhos nas origens remotas das cantigas, cuja origem se perde na noite dos tempos. No entanto, uma vez descortinando-lhe o verdadeiro sentido, se nos apresenta com sabor de novidade, pois são as cenas cotidianas – festas, rituais, celebrações – que traduzidas em música sempre tem caráter renovador, compreendendo-se a tradição como algo vivo.
O pesquisador e músico Eliezer Teixeira
Sami Bordokan
cd do Zé Gomes
Reproduzo abaixo versos do Zé Gomes, que ilustram seu disco de estréia,
onde pela primeira vez se faz uso na musica instrumental brasileira da
viola de cocho fora do seu uso corriqueiro, ou seja, do siriri, chamamé e
outros ritmos locais:"Esta violinha
Todas as manhãs
Toma o sol nascente
Para aprender a não
ser preguiçosa
Oi abre alas!
As Musas ditosa
Palavras Querem Dizer
Adormecida no seio da
terra
Guardiã dos saberes
mais antigos
Traz em seu ventre
fecundo
O fel e o mel
Dos honmens mortais
Eis que o Céu se abre
Para todos os viventes
Oniscientes os Deuses
Assim desejam
Fazer vir cantar a boa
nova
A Viola de Cocho
De percussivo toque
Impelindo a dança
Com trepitoso soar
De chama ardente
ilumina
De chama ardente
ilumina
Recanto dos espaços
infinitos
Do nosso interior
Oi abre alas!
(Zé Gomes, no encarte do CD Palavras Querem Dizer)
Zé Gomes
Viajemos, pois, ao som de violas, no texto inaugural da primavera, onde as artes brasileiras convidam a muitas andanças. Como diria ZéMaria, Guru do ser-tão paulistano, conhecedor dos secretos Caminhos do Peabirú (as rotas antigas conhecidas pelos índios que os faziam andar pelas matas sem se perder), basta um olhar sem pressa e arguto para se descortinar a beleza oculta nos orelhões transformados em objetos de arte, mal percebidos na azáfama diária. E se reparar bem, veremos que o verde desponta faceiro debruçando-se sobre as formas concretas...