Ser Tão São Paulo


Logo após a chegada à São Paulo as pessoas lá das bandas do interior acreditavam que os moradores daqui, principalmente os caipiras do interior, só conheciam o caminho de casa para o trabalho e do trabalho para casa. Acreditavam, já na segunda metade do século passado, que sair daqueles “locais seguros” (casa/trabalho) seria perigoso. Casa aqui como  simbolismo do lar, pois acreditavam também que todos por aqui morassem em apartamentos. Quando disse que morava em uma casa, no bairro do Ipiranga, saia pelas ruas, conversava com os vizinhos e que existia vida fora do ambiente casa/trabalho alguns “Tomés” colocavam em dúvida a afirmação.

 Em um fim de semana prolongado o Wanderley Chiara, em uma roda de amigos lá no bar do Toninho Foiçada, apelido adquirido por ser um viril zagueiro de futebol, do tipo que costumam chamar de “beque de fazenda”, disse: “Zé Maria, lá em São Paulo vocês não tem um bar assim, onde os amigos se encontram, conversam, né?”. De imediato pedi as palavras do Dr. Célio, jovem e bem sucedido advogado, que morando no bairro do Jabaquara é bastante conhecido, frequenta os locais onde encontra os amigos e vive uma vida de interiorano. Mesmo usando sua capacidade de verbalização pareceu não convencer o Wanderley Chiara, que esteve em São Paulo duas vezes, praticamente dentro, do carro nas ruas  e da casa dos parentes.

Um outro constante e presente questionamento é “e quando volta prá cidade, quando se aposenta?” como se a passagem por São Paulo fosse uma obrigação necessária e forçada, o suficiente para conseguir a tão sonhada aposentadoria. Também tem uma outra “o que você tá fazendo lá?,  vem prá cá, aqui que é lugar prá viver”. Uns poucos ficam indignados quando digo que gosto de São Paulo, me sinto bem, sou feliz e que não tenho planos e vontade de voltar.

Na repetida frase de que existem muitos motivos para amar e odiar São Paulo é muito mais fácil encontrar motivação para amar e esta motivação está ao alcance de, muitas vezes, um simples olhar para o lado, um simples sorriso que se dá e se recebe. É possível não entrar na correria, na disputa dos egos, da individualidade de algumas pessoas. 

Em São Paulo tudo, tudo mesmo, acontece a todos os momentos do dia e da noite. Gente de todos os cantos do Brasil e do mundo, gente que aqui trabalha, é feliz e transmite felicidade para os outros. Recentemente minha irmã, meu cunhado e sobrinhos “passaram uns dias” aqui e no sábado foram assistir à uma apresentação musical do Oswaldo e Marisa Viana quando se surpreenderam por estar em um lugar onde a amizade, o contato com amigos, os músicos e os convidados é natura

A origem deste Ser Tão Paulistano é consequência do nosso encontro com o caipira Giba, o da Viola, mestre da contação de causos, com a Fernanda, premiada escritora nascida paulistana quatrocentona da Vila Mariana que tem o dom do bem escrever. Nasceu dos bons papos no Café Fubá, no baião de dois do Ribinha, no festival de inverno de Paranapiacaba, na festa do Divino de São Luiz do Paraitinga, sempre com alegria, amizade, troca de conhecimentos e emoções. Em uma noite no Lua Nova, em que um grande número de músicos homenagearam o extraordinário cantor e compositor João Bá e sob as bênçãos da Musa Kátya Teixeira o poeta, escritor e caipira com gosto e tradição Joca Ramiro foi nos apresentado e passando de imediato a fazer parte do time. 

A insegurança das ruas não  impede que os moradores se manifestem, se organizem, procurem formas e meios de conseguirem um futuro melhor para todos. Centenas trabalham voluntariamente em organizações dedicadas à melhoria das condições de vida de outras pessoas, centenas outras anonimamente pensam no próximo. Basta sair ás ruas, aos bairros e ver que a solidariedade é uma marca cada dia mais presente nesta cidade. Morar em São Paulo é gratificante, existem mil formas de participação, de troca de conhecimentos e de aprendizagem. 

Obrigado São Paulo.

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