PAULO VANZOLINI

“De noite eu rondo a cidade A te procurar...”
Não é fácil escrever sobre Paulo Vanzolini: louvá-lo, elevá-lo aos píncaros da glória não combina com seu jeito bonachão e simples, um senhor que se o encontrássemos na rua e não o reconhecêssemos, levaríamos conosco para o resto do dia seu jeito amigável e simpático de ser. E, por outro lado, não dar à sua obra o valor e o destaque que merecem da história da música e da ciência do Brasil, é injusto.
São Paulo tem muitas caras, as caras dos imigrantes e emigrantes, as muitas tribos. A cidade abraça descolados e radicais de vários matizes; pelas ruas, cores e gestos, idades se misturam; na mesma calçada cruzamos o empresário, o hippie, o mauricinho, a dondoca, a perua, a lady elegante, o operário. Inúmeros são, sem conta, os personagens que poderíamos denominar como “a cara de São Paulo”: artistas, anônimos, esportistas, artistas plásticos, até mesmo políticos (vá lá, um pouquinho de boa vontade), contudo, dentre tantos que podem significar a cara de nossa cidade, sem qualquer sombra de dúvida, Paulo Vanzolini está em qualquer lista, pois sele amava como poucos essa cidade à qual dedicou toda a sua vida profissional. E fazia isso simplesmente sendo o que era: o cientista com importante trabalho de pesquisa e o compositor que extraía seus temas diretamente de suas andanças pela cidade. A música Ronda, cujos versos iniciais eu cito na abertura dessa missiva, é sintomática em qualquer tentativa de entender ou tentar definir Paulo Vanzolini: sempre à procura de desvendar mistérios – como é natural a todo cientista, desvendar os mistérios da alma de nossa gente: o Cuitelinho, recolhido por ele no interior paulista, que foi incorporada ao folclore nacional e é conhecida até no exterior, precisamente em Portugal.
- doutor em zoologia, distinção conferida nada menos pela Universidade de Harvard, herpetólogo (especialista em répteis), professor emérito da USP, autor da lei que criou a FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo), teve entre seus alunos o escritor e médico Dráuzio Varella. Era respeitado por seus pares cientistas como pesquisador meticuloso e tinha o mesmo cuidado com os sambas que compunha, chegando às vezes a demorar um ano numa composição até dá-la por pronta... Em suma, um pouquinho só de Paulo Vanzolini, o sambista-cientista, que circulava com igual desenvoltura entre os dois mundos, convivia com Aziz Ab’Saber, Ernest Mayr, Adoniram Barbosa, Carlinhos Vergueiro, Eduardo Gudin, Elton Medeiros, Toquinho, Chico Buarque, entre outros.
Discografia:
2003) Acerto de contas • Biscoito Fino • CD
(1997) Paulo Vanzolini • Movieplay • CD
(1990) Paulo Vanzolini-grandes compositores-série inesquecível • RGE • LP
(1981) Paulo Vanzolini por ele mesmo • Eldorado • LP
(1974) A música de Paulo Vanzolini • Marcus Pereira • LP
(1967) Onze sambas e uma capoeira • Marcus Pereira • LP
CUITELINHO
Cheguei na beira do porto
Onde as onda se espaia
As garça dá meia volta
E senta na beira da praia
E o cuitelinho não gosta
Que o botão de rosa caia,ai,ai
Ai quando eu vim
da minha terra
Despedi da parentália
Eu entrei no Mato Grosso
Dei em terras paraguaias
Lá tinha revolução
Enfrentei fortes batáia,ai, ai
A tua saudade corta
Como aço de naváia
O coração fica aflito
Bate uma, a outra faia
E os óio se enche d´água
Que até a vista se atrapáia, ai.
O “Cuitelinho” remonta ao folclore pantaneiro, fala da saudade do soldado que retorna da Guerra do Paraguai. “Cuitelinho” é outro nome que se dá ao Beija-Flor. O tema foi recolhido durante uma pescaria - não sei se no Pantanal ou no interior paulista e foi gravado por muita gente, inclusive Pena Branca e Xavantinho, Nara Leão, Dércio Marques, Milton Nascimento, etc. Observação: Paulo Emilio Vanzolini não tocava nenhum instrumento.
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