Se 2015 chega em São Paulo, chega com trejeitos. Das inúmeras pessoas que resolvem andar na contramão do que costumamos por aqui, o peito se enche no maior estilo: não é que dá pra ser diferente?
Em conversas com amigos, muitos deles cansados, bate-volta aparece aquilo que está em voga, e o blábláblá de sempre: ciclofaixas (tem gente contra, tem gente a favor e aqueles que não sabem); preços abusivos dos imóveis, e com eles os aumentos de iptu (tem gente que acha que é bacana ricos pagarem mais, pobres pagarem menos e tem aqueles que nem sabe o que está acontecendo); por fim, pra dizer das coisas que são ditas por dizer, o aumento das tarifas de transporte e a isenção delas para estudantes de baixa renda.
Essa descrição não corresponde o que é São Paulo hoje. Alías, está muito distante. Mas em conversas com amigos, uma palavra sempre aparece: padrão. Padrão de vida. Alguém disse que tanto faz, que não vamos ter mais água mesmo, culpa do governo do estado que não cuidou da água, que não cuidou do metrô, daí que, poutz, voltamos aos blábláblás costumeiros. Culpa nossa também, que não estamos nem aí. Enfim! O fato é que não quero falar dessas mesmices, desses descontentamentos.
Quero dizer das possibilidades. E São Paulo cresceu com essa esperança. Os nordetisnos vieram para cá, os sulinos, gente de todas as regiões do país, de fora. Muitos da América Latina, outros da Europa. Existe esse ciclo de gente incontente com o lugar em que vive, que e solução está onde não se vive. Está longe. Para muitos paulistanos está na Europa que, falida, vê oportunidades em São Paulo. Aquele cachorro correndo atrás do rabo.
Eu tenho um amigo que vê em São Paulo todas as coisas lindas do mundo. Esse amigo viajou o muito. Não digo de uma ou duas viagens para fora. Digo de muitas, e ele diz: São Paulo é a melhor cidade para se viver. E todo dia coloca no facebook uma foto do Parque da Aclimação que pra muita gente não tem charme algum.
Eu aprendi São Paulo aos 30 anos. Já tem 8. Eu aprendi São Paulo com essa gente violeira que sempre aparece nesse blog, com o Zé Maria e com a trupe do Café Fubá. Depois eu aprendi a cidade indo para as perifereias, quando comecei a fazer fanzines. E quando os fanzines começaram a me fazer.
Essas coisas vão apresentando as oportunidades que a cidade dá. Nestes últimos 8 anos eu mudei o meu padrão de vida. Diria que ele pegou a rampa e escorregou ladeira abaixo. Reaprendi a viver em São Paulo e, embora eu esteja passando por momentos muito complicados por aqui, não penso em me retirar. Isso eu pensei até os 30.
Até os 30 eu não pertencia a São Paulo. Meu jeito de vestir não correspondia. Meu jeito de viver não correspondia, meu jeito de andar, de sentar, de lavar a louça, de fazer a comida, todo esse meu jeito não correspondia ao padrão paulistano. Isso é um contraponto já que São Paulo aceita todos os jeitos. Foi isso que eu aprendi, e é por isso que, hoje, eu sou plena em São Paulo. Poderia ser plena em qualquer outro lugar do mundo. Isso de ser feliz, de ser alegre, de escolher viver depende da minha condição emocional comigo mesma, muito mias comigo e muito menos com a cidade que escolhi para viver.
Daí me dizem: São Paulo está muito cara. Aliás, eu digo isso a maior parte do meu dia. Mas esse custo pode ser driblado. Nesses 8 anos comecei aprender a viver com menos, e isso não quer dizer que vivo com menos do que as pessoas que estão ao meu redor. Eu posso fazer uma viagem internacional por ano, como essas pessoas fazem depois de trabalharem 8 horas por dia, todas as semanas, 15 dias de férias por mês. Eu não trabalho assim e nada me dá a certeza de que mudar daqui me daria uma condição melhor de trabalho que não essa, feita para escravizar, para colocar pessoas dentro da caixa de alguma empresa.
Tem anos que me dei a liberdade de não viver isso. Então eu vivo com menos. Com menos coisas compráveis, com menos coisas impostas pelo capitalismos, mas no fim das contas, vivo tanto quanto as outras pessoas. E por que? Porque aqui existem opções. Existe exposições na Pinacoteca do Estado, entrada de 6 reais, mais divertido que um cinema, que custa 25. Anote que a entrada na Pinacoteca do Estado dá direito a entrar na Estação Pinacoteca, e com mais 6 reias, dar um pulo no Museu da Língua Portuguesa.
Vendi o carro e estou aprendendo a ser pedestre. Não pago 25 reais de estacionamento por hora para comprar coisas baratas na 25 de março. No máximo perco meu óculos de sol. 7 reias de transporte público não me parece barato para chegar até a 25, ao mercado municipal, à José Paulino. Mas na conta dos juros, vale. Daí é preciso entender um pouco de economia e ver que qualquer centavo, hum, é um centavo investível.
Existem muitas pessoas aderindo ao minimalismo. Ao viver com pouco, ao viver com menos apressadas. É quando elas passam a curtir o Parque do Ibirapuera, a fazer piquenique, a driblar toda essa especulação crescente e absurda, dia após dia. E que dói no bolso, mas que não pode doer na alma.
Aqui a gente pode ouvir boa música de graça em muitos espaços. No Centro Cultural Vergueiro. Então eu fico pensando: afinal, o que é qualidade de vida; ou melhor, quem é que faz a qualidade de vida em que a gente se enfia sem mesmo se questionar?
Eu brinco: preciso de 17m2. O resto é a liberdade de ir e vir. De quanto você precisa? Uma mansão no Jardim Europa para administrar 15 empregados e depois trabalhar, e trabalhar ainda mais só para administrar os 15 empregados e fazer uma viagem para algum país diferente durante 20 dias no ano?
Eu preciso por os pés pra fora de casa. E começo minha viagem. Tenho a opção de gastar 200 reais numa refeição em algum lugar da moda, e nas últimas experiências, a comida nem é tão boa assim; bem como tenho a opção de juntar amigos em casa para uma bela prosa em que esses 200 reais gastos na compra daquilo que vou oferecer ganha projeção geométrica pelo simples fato de eu estar com pessoas queridas, onde nos tratamos bem, e com afeto. Aposto até numa comida melhor do que a de muito restaurante chique e eu sequer sei cozinhar. Sim, nos acostumamos a pagar caro por serviços ruins. Mas podemos escolher outras formas, e nenhuma delas vai derrubar meu padrão de vida. Vai apenas diminuir o meu gasto, e me dar mais prazer. Depende de mim.
Tem 8 anos que eu vivo com menos, e tem 8 anos que meu padrão de vida não caiu. Caiu meu poder de compra mas, sinceramente, tenho dúvidas se uma coisa tem a ver com outra.
Se eu tenho dúvidas, estou cheia delas. Se eu tenho medo porque estou passando por um período de desemprego, estou cheio deles. Às vezes meus olhos caem, os pensamentos me tomam. Mas isso aconteceria da mesma forma com qualquer outra forma de viver que eu tivesse escolhido. Não há plenitute que não tenha uma recaída.
Nos últimos 8 anos eu arrisquei. E não me arrependo.
Nos últimos 5 meses eu me entreguei ao amor. E todos os planos ficaram para depois. Também não me arrependo. Os planos eu posso por em prática em qualquer momento. Isso porque vivo numa cidade que me dá oportunidades. Em que posso viver em 17m2 e não perder meu padrão de vida, pelo contrário, ganhar muito com isso.
Às vezes é preciso seguir a onda. Estou recuperando minha bike, para aproveitar as ciclofaixas, digam o que quiserem dizer. É uma bicicleta de 20 anos atrás. Mas tudo bem, eu tenho uma tv de tubo de 14 polegadas no meu quarto e nem penso em comprar uma de tela plana. E já passou tanta coisa por mim, que eu não precisei, que não aumentou ou diminuiu meu padrão de vida por não ter feito diferença alguma.
Nunca tive um disc man, e nunca senti que estava perdendo alguma coisa. Nem da tevê de tela plana eu sinto falta. Tenho os mesmo acessos com a minha tevê de tubo adaptada.
Afinal, o que é padrão de vida? Como isso é medido? Sei que nos últimos 10 anos meu poder de compra diminuiu absurdamente, as razões não são relevantes nesse momento. Sei que aos 30 anos eu podia comprar um apartamento com determinadas características, hoje eu não possso. Mas ainda me pergunto se isso é mudar muito um padrão de vida. Acredito mais na mudança de paradigmas.
As chances de encontrar a felicidade não diminuem pelo fato de se viver num quarto alugado, mas sim pelo que a gente sente, e cria, quando está nesse quarto alugado. Tem Europeu que não está contente com a crise de lá, e está aproveitando pra vir pra cá. Eu já disse isso acima, que tem um monte de gente daqui querendo ir para lá. Mas eu insito, para achar seu lugar no mundo, mister é olhar para dentro da gente mesmo, que os padrões perderão seus sentidos.
Olhe em sua volta e veja, veja no quanto São Paulo estabelece e no quanto São Paulo quebra padrões. Outras cidades fazem o mesmo. Então o que eu concluo, mesmo, que é preciso, de verdade, independente de qualquer coisa, colocar os pés para fora.
E já que tudo se torna mais simples do que parece, deixo a você os desenhos de boa sorte em toda sua caminhada, qualquer que seja ela. Não há um padrão que seja correto, outro que seja incorreto. O que existe, mesmo, é a gente, e quem está ao nosso redor. Então, aproveite!