Todo final e começo de ano, nós do Ser-tão Paulistano elegemos os TOP DEZ do ano que passou. Não se trata de eleger os melhor disto ou daquilo, mas destacar personalidades, instituições ou eventos que tenham contribuído para a vida sócio cultural no ano passou ou nos últimos anos.
Este ano tivemos trabalho, pois foram inúmeros os destaques e se fôssemos fazer justiça, viraria TOP Vinte ou TOP Cem! Isso é alvissareiro, pois mostra que nossa riqueza, seja cultural ou humana, está cada vez mais presente e basta olhar para o lado para descobrir: quanto mais aprendemos a olhar, mais descobrimos o valor de nossa gente. Como fizemos outras vezes, o número DEZ é puramente simbólico e representativo.
A ordem que segue é puramente aleatória, não existe o primeiro ou décimo. É nossa singela homenagem, contrapondo a grande mídia que costuma premiar os vencedores. Nós premiamos com nossa lembrança aqueles e aquelas que contribuem para tornar nosso mundo melhor, mais bonito, mais humano:
- CAIPIRAPURÚ: e as rodas de viola, costume muito comum foi levado a Praça central da cidade e assim, já se vão 14 anos! O evento idealizado por Julio Santin, artistas e moradores da pequena cidade de Irapurú, extremo oeste do Estado de São Paulo mobiliza durante alguns dias do final do ano toda a região da Alta Paulista. Essencialmente é um evento “caipira.” Contrapondo aos grandes festivais “sertanejos” o Caipirapuru prima pela simplicidade e artistas de renome se misturam aos habitantes e artistas da terra, cujas mãos lavram a terra e extraem sonoridades mágicas e delicadas dos instrumentos. Acreditem, isso ainda existe e o Caipirapurú é prova viva!
- OS SERTÕES, CD de Roberto Bach. O disco foi produzido e lançado já faz anos, mas é praticamente desconhecido. Provavelmente seja o trabalho musical mais fiel que já se produziu sobre Canudos, o sangrento e vergonhoso episódio de nossa história que teria entrado para o esquecimento não fosse o trabalho quase solitário de Euclides da Cunha. O trabalho é baseado na obra de Euclides e nas 13 canções do álbum são narrados em forma de musica os episódios mais significativos, desde as andanças do Conselheiro até a matança final.
- DANDÔ, Circuito de Música Dércio Marques, um Canto em Cada Canto: merece destaque e louvor a iniciativa da Musa da Música Brasileira, expressão criada pelo José Maria de Oliveira, alcunhado Guru do Sertão, para justamente homenagear Katya Teixeira, não somente cantora, compositora, designer, mas agente cultural. Mulher decidida está aí! Com garra, dedicação e talento incomuns, pôs-se na estrada e materializou o desejo de Dércio Marques de formar público e artistas, provocando no bom sentido o possível diálogo entre as diversas e ricas expressões musicais de nossa terra. O Dandô contribui grandemente para a integração musical do Brasil e mesmo com nossos hermanos vizinhos!
- ARREUNI, projeto “irmão” do DANDÔ, iniciativa do João Arruda e amigos, criado para homenagear e tornar viva a presença do andarilho musical Dércio Marques. A palavra “arreuni” foi extraída da música de mesmo nome do cantor e compositor Chico Maranhão, gravada por Doroty Marques, no disco Erva Cidreira. Cantiga simples, mas de grande força poética, tornada ícone, sempre executada com grande emoção por Dércio e Doroty ao longo de suas carreiras.
- O TEMPO e o BRANCO. Finalmente em 2014 veio a lume um dos trabalhos mais esperados dos últimos tempos: culmina em chave de ouro a parceria de Consuelo de Paula e Rubens Nogueira. Com a viola de Neymar Dias e o acordeon de Toninho Ferraguti, Consuelo “deu asas à poesia”, pois a principal inspiração partiu da poesia da carioca Cecilia Meireles. Com delicadeza e leveza, nos convida a um vôo pela musica e poesia do Brasil.
- PUISIA, disco do Trio José, baseado na poesia oral do mineiro Juca da Angélica. Já faz anos que o poeta Paulo Nunes dedica-se a pesquisar e divulgar a poesia de um dos últimos mestres desta arte milenar. Puisia é a transcrição musical de alguns poemas do mestre, extraídos do livro “Meu Canto É Saudade.” Os meninos do Trio, mais as presenças do próprio Juca e um magote de gente talentosa promovem um encontro de gerações para atravessar os tempos! A cidade encontra o sertão e ambos se respeitam, tornam o diálogo possível, com propriedade e sensibilidade, preservando a qualidade literária e o lirismo do autor.
- DESABOIO, livro-cd, de Saulo Alves, com poesias de Paulo Nunes. Desaboio, um neologismo criado a partir da destruição implacável de um dos biomas mais ricos do planeta, vitimado pelo avanço inexorável da monocultura da soja em larga escala. As “autoridades” consideraram o cerrado como um “grande vazio”, da mesma forma como justificou A Marcha Para o Oeste, em fins da década de 1940 rumo ao interior do Brasil, ognorando a presença de dezenas, centenas de nações que ali viviam. Trabalho poético musical que vai além da arte ou da denúncia: é um cuidadoso trabalho de garimpagem que mostra a beleza que a vegetação seca e amarela esconde. Deleita e ensina que sua preservação é um legado para o futuro, antes que os agrotóxicos transforme em deserto estéril o que a mãe natureza conservou ao longo de milhões de anos.
- JAIME ALÉM E O cd “MEU RELICÁRIO”: encantamento, não existe outra palavra para designar esse trabalho de mestre. Jaime Além é um habilidoso instrumentista, conhece os segredos, mas o que impressiona nele é a intimidade com os instrumentos, tratando-os como se fossem extensões dele próprio! Salta aos olhos o respeito e o carinho, a delicadeza com que trata cada tema, burilados cm maestria de ourives: da canção de amor à lembrança da infância à dança agreste: o “relicário” de Jaime Além é uma caixinha de pedras preciosíssimas, com que ele generosamente nos presenteia...
- FAMILIA COUTEIRO/MORAES: Sabah Moraes e Ney Couteiro quando sobem no palco magnetizam e seduzem quem tem a ventura de os ver em ação. As oito cordas do violão de Ney e o encanto brejeiro de Sabah possuem o raro dom de surpreender e encantar, não apenas pelo domínio da técnica impecável, mas pela identificação e cumplicidade: o público “sabe” que eles são gente como a gente, neles o artista não se separa da gente do povo, eis um de seus segredos. Ou melhor, seu maior segredo. Cidadãos e artistas, assim são eles: ultimamente tem revelado outras facetas artísticas: Ney mostra-se fotografo respeitado, Sabah lança livro de poesia e pelo andar da carrugem, a família Moraes/Couteiro tem muito mais por vir, pois o talento ali é genético!
- merece ser conhecida a arte da PALHAÇARIA levada a cabo por Angela Quinto e seu grupo. Além de uma arte milenar cultivada em todos os cantos do planeta, por todas as sociedades (sabiam que entre os Krahô o palhaço é uma função sagrada???) A “palhaçaria” é uma Arma, não apenas contra a mesmice e o tédio. O palhaço põe a nu e reduz ao ridículo as ilusões pretenciosas de poder. Mas além de tudo isso, é Cura, pois faz rir!
E merece destaque, para finalizar essa singela homenagem aos artistas de nossa gente, o livro de poesia de Paulo Nunes, O CORPO NO ESCURO. A poesia volta a ordem do dia, que bom! Menção super honrosa para POEMODA, a poesia em prosa e verso, de Ethel Frota e Alan Romero; para Valdir Verona e Giancarlo Borba, para o Cantinho do Ipiranga, para Sarah Abreu e Carlinhos Antunes e a gravação - em fase de finalização - do CD com musicas de Violeta Parra, para o trabalho incansável de Mercedes Cumaru! Como se vê, vamos solicitar autorização para a Editora Chefa Fernanda de Aragão espaço maior nesse nosso trem!