Ao completar 21 anos de carreira,
Katya Teixeira festeja a data e nos brinda a todos com um show no Sesc
Belenzinho, marcado desde já pelas credenciais de que será belo, inesquecível, emocionante: o espetáculo “Cantariar”, para celebrar as
inúmeras parcerias, musicas de suas participações em discos parceiros ao longo
do tempo: João Bá, Vidal França e Mazé Pinheiro, Eliezer
Teixeira, Luiz Carlos Bahia, Ney Couteiro, Consuelo de Paula, José Eduardo
Gramani, Dércio Marques e Doroty Marques, Amauri Falabella, Erick Castanho,
Antonio Pereira de Manaus, João Arruda, Levi Ramiro, João Evangelista
Rodrigues, Viola Quebrada, Tarancón.
Uma carreira plena
e intensa, a inquietude de quem tem muito a mostrar, o tempo todo, da arte oculta
na memória e no coração dos povos, a arte pura que as grandes mídias não se ocupa
em divulgar, mas que aí está. De sua própria lavra são, até o momento, quatro
CDs: Katcherê,
Lira do Povo, Feito Corda e Cantiga e 2Mares, este último em parceria com o
violeiro, cantor e compositor mineiro Luiz Salgado. Há outro já no forno,
“As Flores do Meu Terreiro”, que deverá ser lançado pelo meio do ano.
Sim, há muito a
comemorar: 21 de carreira – prestes a completar 22 - 4 CDs, todos “independentes”, cada qual trazendo
uma proposta distinta e clara, cada qual ricamente madurado e elaborado.
Dezenas de projetos, muitos em parceria com o
SESC SP, como a antológica série “Diálogos Sonoros”, rica mistura de
música, teatro e literatura. Outro projeto marcante foi o “Mulheres do Sol”,
produzido em parceria com Marinéa Mochizuki (Trattore), realizado no Centro
Cultural Banco do Brasil, série de 5 shows onde a cada noite dividia o palco
com uma grande dama da música latina. Sua
última grande empreitada, que deverá ser projeto permanente, Dandô – Circuito de Musica Dércio Marques,
cuja principal característica é a autonomia, ousada proposta de fomentar a arte
popular. A ideia nasceu como uma homenagem ao grande Dércio Marques, o aedo andarilho da música, que dedicou
vida e carreira a formar músicos e público pelo Brasil afora e até nos países
vizinhos. De vez em quando parava e fazia um disco, como um peregrino que
erguesse torres, imagem lindamente sugerida pelo jovem filósofo Duda Bastos.
Em todos esses
anos, sempre que Kátya empunhando seus instrumentos e com seus vastos e
rebeldes cabelos sobe ao palco, uma expectativa se acende no público, pois uma
força magnética dela irradia e se espalha, em ondas; mesmo quem a conhece e
acompanha suas atividades prende por instantes a respiração, pois sabe que algo
surpreendente saíra de seu alforje, seja
a emoção de uma cantiga dolente, seja a força de um canto guerreiro negro ou
índio ou um canto de trabalho. Ou um breve pronunciamento, uma história, dentre
as muitas que recolhe em suas andanças: se há uma imagem provável da
surpreendente Kátya é aquela que une num mesmo ser a delicadeza do Lírio
Silvestre e a força indestrutível do Carvalho. Ou melhor, de um Jequitibá, para
salientar a brasilidade!
Seu canto transita
desenvolto de uma cantiga infantil a um brado desafiador. Regida pelos acordes
primitivos de sua viola-de-cocho ou sua Rabeca “Zéfinha”, é canto que envolve ora
com doçura e aroma de pétalas, ora o
rasgo dilacerante de punhal. Voz que ressoa doce e meiga como noite de luar ou selvagem e crua como as força das marés, do
vento e do fogo; seu canto celebra o amor, e a dor, e a luta; corpo e voz atemporais
viajando, formando e/ou restabelecendo elos invisíveis entre o tempomemória e o porvir. Ao fim de suas apresentações, uma
estranha energia continua pulsando, pairando na atmosfera e cada um dos
assistentes tem a intima certeza de levar consigo séculos de história de um
povo alegre, forte, caloroso.
Os contados 21 anos marcam sua
subida num palco, o então Armazém Bar, sob os aupícios abençoados de Oswaldinho
e Marisa Vianna. Mas na verdade seus anos musicais datam de muito antes, pois
desde os 10, 11 anos já empunhava um violão com quase o seu tamanho e aos 13
participou do disco de seu tio, Vidal França, dentre outras peraltices. Na
verdade, sua carreira é sua vida, sua casa sempre foi um alegre caldeirão onde
o tempo todo recendia música e cultura popular. Conta ela: “... a primeira vez num palco acho
que foi num festival do colégio aos 11 anos, cantando uma música do meu avô que
era seresteiro. Na realidade aprendi mesmo a cantar foi com minha mãe e a
família dela, que faziam isso o tempo todo. Do lado paterno, de meu pai Chico e o meu tio Eliezer, me forneceram base e fundamentos da
realidade brasileira, por conta das pesquisas da cultura tradicional e aspectos
políticos da arte, bem como o contato
com os artistas...”
Quando lançou seu
primeiro disco, Katcherê, aos 25
anos, podemos sem erro afirmar que “já nasceu grande”. Sim, “nasceu grande”,
pois “tudo o que sempre viveu e acreditou” estava ali, sem tirar nem por: as
referências índias e negras,composições próprias, as parcerias que marcariam
para sempre sua carreira (Jean Garfunkel, Vidal, João Bá, Ney Couteiro, Mazé
Pinheiro, etc), a musica de Irene Portela, sempre jovem e poderosa e os belos
arranjos de Vidal França. Se Katya tivesse ali encerrado sua carreira já teria
dado uma enorme contribuição para a música brasileira e seu disco mereceria ser
citado nas enciclopédias dali por diante.
Mas quando se
esperava uma espécie de Katcherê II – pois o caminho por ela iniciado era
apenas um inicio de desbravar – eis que cinco anos depois de uma longa pesquisa
por sul e norte/nordeste do Brasil, eis que como uma feiticeira encantatória,
nos lança aos olhos e ouvidos atônitos o Lira
do Povo, disco que surpreende em tudo, a começar pela confecção física do
álbum, cada unidade inteiramente feita à mão e sua voz misturada a da gente do
povo: rezadeiras, lavadeiras, vaqueiros, mães e pais de santo, todos ganham voz
de verdade no disco. De Portugal chega uma versão de “Adeus Ó Serra da Lapa”,
de Zeca Afonso. De entremeio, uma rara participação do “mago” Stenio Mendes
Nogueira, mestre de tanta gente. Lira do
Povo é um disco indecifrável: world-music,
etno-music, mpb?
Vontade de mergulhar
em lusofonias e africanidades não faltou. Tinha o projeto de juntar
Bahia-África-Minas-Trás-os-Montes-Ãlentejo numa gigantesca parceria com
artistas locais, que a falta de grana refreou, mas Katya faz valer a máxima “se
não tem tu vai com tu mesmo” e em vez de lamuriar, convidou alguns amigos para
uma animada prosa com direito a café de bule, bolo de fubá e cachaça e assim
nasceu “Feito Corda e Cantiga”, com
composições de Chico Branco, Garfunkel, Mochel e Luiz Perequê. E, claro!,
participação dos Caiçaras do Acaraú, Fandangueiros e Vida Feliz de Cananéia,
que também participaram do show de lançamento, no mesmo Sesc Belenzinho. Noite
de gala, inesquecível para quem viu e ouviu.
Bom, se a ideia de
uma mega parceria mundial, por razões financeiras ainda não se concretizou sob
a forma de uma gigantesca vídeo-conferência-show via satélite, seu projeto
seguinte veio como a dar uma “palhinha”: o Cd 2Mares, parceria com Luiz
Salgado, vôo de pássaro mítico formando uma ponte sobre o mar brasileiro e o
mar português. Trabalho antológico, onde pela primeira vez na história um Santo
quase vira casaca: mostra de verdade a transformação ocorrida com São Gonçalo
do Amarante, que de severas vestimentas negras e vetustas em Portugal, ao
chegar ao Brasil, desbunde total – sorte dele não existir na época redes
sociais, pois se a noticia chega ao vaticano, seria excomengado: deixa crescer
os cabelos, põe roupas coloridas e cai na dança: mistérios que só a sabedoria
popular é capaz de explicar. Méritos aos artistas que resgataram as cantigas
e ao poeta Paulo Nunes que reescreveu a trajetória de São Gonçalo em terras
tropicais...
O espetáculo “Cantariar” coroa
uma trajetória honesta e coerente. Quando ela sobre no sagrado espaço do palco,
todos nós nos sentimos representados, pois é a voz de todos, a voz de um povo.
Sentimos orgulho por fazer parte de sua geração, como devemos sentir orgulho da
história que construímos e das nossas capacidades. Kátya agrega em si essa capacidade que poucos
artistas conseguem sintetizar, a de verdadeiramente ser interprete. Quando ela solta a voz, é a própria voz da lavadeira,
da doceira, do operário, do camponês, do vaqueiro, do pescador, do escravo, do
índio. Ver, ouvir e aprender com Katya Teixeira, seu amor pela
nossa arte e por nossa gente, é enxergar caminhos: se fosse
possível sintetizar numa frase ou num nome, num corpo ou numa voz o sentido de
“arte popular”, tudo caberia num nome: Kátya Teixeira, que carrega consigo
legiões.
SERVIÇO:
Dia 09 de Abril, 21:00 horas, SESC
Belenzinho.
Kátya Teixeira apresenta nesse show
repertório do CD Cantariar, coletânea comemorativa de seus 21 anos de carreira.
A apresentação terá a participação de músicos que fizeram parte dessa jornada
como a percussionista Cássia Maria, o violonista Ney Couteiro, o rabequeiro e
saxofonista Thomas Rohrer,Vidal França, Amauri Falabella, Oswaldo Rios (Viola
Quebrada), Antonio João Galba, integrantes do grupo Tarancón e Daniela Lasalvia.
Repertório
do Show e do CD “Cantariar”
1- Dois
Sertões - 2013 - Ronaldo Pereira e Poli Brandani
2- Os grilos são astros - Cantos da Mata
Atlântica/ Dércio Marques e Doroty Marques - 1999 - Rosinha de Valença
3- Encantado
- Capiau/ Levi Ramiro - 2013 - Levi Ramiro e João Evangelista Rodrigues
4- O Canto das
Águas Serenas - Espelho D ´Água/ Dércio Marques - 2001 - Regina
Rosa
5- Fotossíntese -
Cavaleiro de Macunaíma / João Bá - 2013 - João Bá e Ney Couteiro
6- Roxa
cor da saudade - Parceria/ Amauri Falabella - 2015 - Kátya Teixeira e
Amauri Falabella
7- Canteiros
do Coração - Afluentes / Antonio Pereira - 2007 - Antonio Pereira
8- Flor de
algodão - Meus Retalhos/ Viola Quebrada - 2015 - Rogerio Gulin, Etel Frota
e Oswaldo Rios
9- Vento
viajeiro - Venta Moinho/ João Arruda - 2013 - Kátya Teixeira e João Arruda
10- Além de
Olinda - Mexericos da Rabeca /José Eduardo Gramani - 1997 - José Eduardo
Gramani
11- Canto Lunar - Vuelvo para Vivir / Tarancón - 1997
- Denise Emer
12- A Lua Girou - Elemental/ Erick Castanho - 2015 -
DP – folclore BA
13- Canto Cego - Capiau/ Levi Ramiro - 2013 - Levi
Ramiro
14- Dia Santo - Sertão e Mar/ Vidal França e Mazé
Pinheiro - 1994/1995 - Eliezer Teixeira e Luiz Carlos Bahia
15- Teus Olhos - Sonhares/ Ney Couteiro - 2008 -
Consuelo de Paula e Ney Couteiro