A CAIXA MUSICAL DE ANTONIO PEREIRA





O cantador amazonense Antonio Pereira acaba de lançar sua “Discografia”. A Discografia, bem entendido, refere-se a um período de sua carreira, os primeiros 21 anos.

A Coleção, sob a forma de uma Caixa Musical reúne seus cinco discos, em ordem cronológica, produzidos entre 1994 e 2015. Esses 21 anos simbolizam tão somente os registros de sua longa carreira, toda ela devotada à musica brasileira, em especial ao universo amazônico que ele conhece como poucos, filho da terra que é. No Amazonas se concentra toda a sua experiência de vida e artística, cuja efervecência de ritmos e estilos surpreende a quem não conhece – ou conhece apenas superficialmente – a região. Mitologias. História. Arqueologia. Utopias. Sonhos. Tragédias. Alegrias. Festa. De tudo isso é composta a Amazônia e o autor Antonio Pereira, um típico caboclo da terra, passeia por seus caminhos e veredas e vai colhendo frutos e flores, que transforma em poesia e musica. Some-se aos 21 anos de carreira discográfica outros tantos de aprendizado de alguém que durante toda a sua vida esteve imerso naquele o mundo de lendas e mistérios.




Mesmo quem já conhece os discos individualmente, ouvir a “caixa” é uma nova experiência, um  renovado encanto emoldurado por uma das melhores vozes masculinas da MPB, desde Milton Nascimento.
Pereira tem uma voz poderosa, mas não é voz que faz calar outras; é voz que agrega somada aos instrumentos, harmonizando-se aos caprichados arranjos, formando um conjunto de grande beleza. Tudo soa aos ouvidos sob medida: ninguém ouve incólume a voz de Pereira, o “Uirapuru Disfarçado de Gente”, para fazer jus à mística amazonense.

Ouvindo os CDs na seqüência de lançamento, mesmo sendo já conhecidos, bafeja um irresistível sabor de frescor. A sequência cronológica dos CDs nos dão uma idéia, não da evolução artística e musical, mas da coerência da obra de um artista que já nasceu grande e desde o primeiro trabalho (O Lago das Sete Ilhas, 1994) mostra completo domínio e segurança do que deseja expressar como artista; nenhuma das canções é supérflua, nenhuma musica foi colocada em qualquer de seus discos para ‘completar’ certo número. Pois a música para Pereira, como para todos aqueles para quem a música reflete a essência da alma, não se trata somente de estética; cada canção representa momentos ou situações especiais, que Pereira interpreta com uma sinceridade visceral, que vem da alma e assim, é como se trabalhasse, em cada tema, todas as possibilidades poético-musicais: podemos gostar mais de uma que de outra, mas o conjunto se destaca pelo mesmo zelo cuidadoso, impecável.

Pereira consegue reunir simplicidade e bom gosto. Sua obra, embora autoral e sem fazer concessão ao sucesso fácil e previsível da industria discografica, é de fácil absorção pelo público, o que faz dele uma figura bastante popular em sua Manaus. Elementos poéticos, folclóricos, místicos, rítmicos, tudo se mistura de forma coerente e harmoniosa. Ouvir Pereira é viajar pelos caminhos de água, atravessar os campos encharcados, acostumar-se à visão das palafitas e da floresta que, vista a partir de dentro parece infinita não só na sua magnitude colossal, mas nas possibilidades que se oferece (essa beleza e essa força, bem o sabemos, não a torna invencível perante a ganância humana, exigindo de nossas autoridades especial cuidado e atenção, pois a preservação da Amazônia é, em si, seu maior tesouro, seu legado para o futuro). A musica de Pereira, um homem do povo, que a região com olhos de poeta mas também de crítico, é uma boa razão para pensarmos a Amazônia com outros olhos, além do lugar-comum exposto no noticiário. Sua música o ouvinte e o convida a estabelecer conexões com mundos d’além: caminhos de barro e asfalto, terras ásperas da caatinga e do cerrado, platôs e montanhas andinas, brancos desertos que milhões anos no passado dominaram a paisagem hoje verde. Existe conexões poderosas, concretas e/ou imaginárias entre a Amazônia e o mundo e do ponto de vista musical, estão presentes na obra de António. Nela se sente a viva presença dos folguedos populares, latinidades e outros sinais de vida do continente que não por acaso tem o formato de um imenso coração: afinal, o que acontece na Amazônia tem ressonância no resto do continente, quiçá do mundo. Através da musica podemos tecer reflexões sobre uma imaginária “aldeia global” que se influencia mutuamente.

A CARREIRA

 Antonio Pereira começou sua carreira discográfica com um grande disco porque o trabalho foi maturado lentamente ao longo dos anos. A Discografia começa e termina no mesmo nível, do primeiro ao quinto trabalho, porque o autor se formou como artista ao longo de muitos anos antes de se lançar ao disco. Conhece, portanto, seu oficio desde a base, podemos dizer.
Tocando desde sempre nos bares, festas, teatros de Manaus, ele aprendeu “na unha”, como se diz. Sua aguda sensibilidade e sua proximidade das pessoas, fez de Antonio Pereira um especialista no que concerne a compreender o gosto do público, ao qual sempre agradou, mas sem abdicar de suas próprias concepções artísticas. Ao decidir gravar, já era um mestre completo de seu oficio e sua obra um bloco sólido que nos foi revelando aos poucos.
Antonio traz a Arte para junto de nós, público, pois ele canta olhando nos olhos do publico.Essa familiaridade é o ponto crucial de sua originalidade, tornando fácil aos ouvidos e olhos do publico que o assiste e ouve, arranjos sofisticados que ele revela sobretudo em algumas raras peças instrumentais de grande beleza (seria possível imaginar a obra de Pereira ornamentada por uma grande orquestra? Essa Discografia poderia ser uma grande Cantata Amazônica, numa desconcertante fusão de ritmos, poesia, dança, folclore, latinidades).

Uma obra com densidade e profundidade porque foi construída com firmes pés no chão e o alicerce fundamental, além do talento, é o universo amazônico, sempre o tema central. E a Amazônia borbulha de histórias, mistérios. Seja de seu passado mítico ou aventureiro, seja do próprio presente; da produção de riquezas, de produtos cosméticos, medicinais; pujante natureza; santuário ecológico.

Os discos:

O Lago das Sete Ilhas (1994);
Lendas (1998);
Estrada de Barro (2002);
Afluentes (2007) e
Luz de Lamparina (2015)






Os títulos não são casuais. Todos evocam  o lugar onde Pereira nasceu e se formou como pessoa e como artista, fiel por todas as dádivas recebidas de forma tão abundantemente: a generosidade da terra, é a generosidade do próprio Pereira.

Cada disco dá o seu recado e embora predomine o astral amazônico, a poesia universal está presente. Se a Amazônia é o “pulmão do mundo” como dizem, por esse pulmão circula a força vital do mundo. A Amazônia dá e recebe.

Os três primeiros trabalhos ( O Lago das Sete Ilhas, Lendas e Estrada de Barro) são desdobramentos de temas comuns do grande e denso caldo;
O quarto disco, o Afluentes, dirigido por Vidal França e com participações nas composições de Chico Branco, Amauri Falabella e a forte presença vocal de Katya Teixeira  nos vocais de Canteiros do Coração é o ponto convergente, que tanto encantou João Bá, que ao me entregar o CD que eu ainda não conhecia, asseverou: “esse eu garanto que você vai gostar!” Ele estava certo, pois gostei e desde o começo foi para mim o elo que faltava, a grande integração entre a Amazônia e o mundo – e não apenas como eterna fonte de exploração.
O quinto disco, Luz de Lamparina, embora seja seu disco mais autoral e pessoal, com musicas compostas ao longo da vida, é o que mais dialoga poeticamente com o resto do mundo além do Amazônico. Destaque para "Vera Cruz" onde tive a impressão de ouvir ecos de viola nordestina, romances mouros...


Amauri Falabela, João Bá, Dani Lasalvia e Pereira

AMAZÔNIA É HOJE!

Um mundo à parte e ao mesmo tempo integrador, permanentemente desafiador. Seus caminhos de água guardam surpresas ao “caminhante” pouco importa o quão habituado se esteja em percorrer suas trilhas liquidas. E toda beleza e desafio do mundo onde reinam as águas, estão presentes  na obra e na vida de um de seus habitantes mais ilustres: Pereira respira Amazônia e seu coração pulsa ao seu compasso.

Somos afortunados por ter ser contemporâneos de um artista que nos lega belíssimos retratos e contundentes retratos da Amazônia e nos oferece a possibilidade de vislumbrar que o ser humano pode perfeitamente viver em harmonia com a natureza. Estejamos atentos, pois o que hoje é uma opção, amanhã pode não ser! Que no futuro não venhamos a ouvir um réquiem para a floresta.


A quem estiver interessado em adquirir, segue o telefone do artista:

(92) 99233-7330 (whatzap). O mesmo também pode ser contatado via facebook. O material é remetido via Correios.


 Dani Lasalvia e Pereira, no Bar do Frango
 Pereira, o autor do texto e João Bá

Inesquecivel noite no Centro Cultural São Paulo:
Lila (ao violão), Pereira, Guru Martins,
Dani, Zé Gomes (violino) e João Bá.
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