“Oratório” é o terceiro livro de poemas da paulista de Taquaritinga e radicada há muitos anos em
Campinas. Ana Salvagni é artista múltipla, seu talento como cantora não passa
despercebido por nenhum ouvido: extrai a máxima essência em suas
interpretações, seja de Adoniran Barbosa
a Elomar, de Heckel Tavares ao cancioneiro medieval. Tudo isso é Ana!
Desde “Janela Sem Tranca”, seu primeiro livro de poesias
(2006), e o segundo, “Fotos no Espelho” (2013), que Ana, a cada vez revela pequenas pontas do imenso bloco de que toda ela é
feita - delicadeza de lírios, solidez de carvalho -, conforme trecho de seu poema Prece VIII deste Oratório.
Efêmera como o som
Fluida como a canção
Calma e nunca cansada
Amém
Uma Efemeridade eternizada, delicadamente guardada no cofre
forte da memória, precioso relicário onde são guardadas todas as preciosidades
de uma vida devotada de corpo/alma à Arte: nela tudo se encadeia em delicadas
sinuosidades luminosas de seus dons de regente, cantora e escritora/poeta de
onde a palavra flui singela e poderosa. E também dilacerante!
No feliz prefácio escrito por Aercio Flávio Consolin, “Ana
Soa”, ele destaca a religiosidade – no
sentido original religare – da “...percepção de si, dos anseios da alma
buscando localizá-la nas amplidões da natureza ou no corpo frágil assediado por
aflições e necessidades que estimulam reações.”
Nos imperceptíveis mistérios entre céu e terra e corpo e
alma, a Arte de Ana, musical e escrita, ressoam momentos únicos, emoldurados sejam
por sua voz única e cristalina e pelos versos que ela recolhe de profundidades
abissais. E generosamente nos revela. Simples e surpreendentes, repletos de delicadeza
e sabedoria, conforme colhemos nas estrofes finais de “Averiguações Para
o Ano Novo”:
(...) o absurdo pede
contenção; o embaraço, um sorriso
a tarde quer descanso;
a tolice, o esquecimento
o impasse pede
intuição; a distração, essência
a poesia quer o mar
aberto.”